quinta-feira, 30 de junho de 2011

Crítica: O Grande Mestre


Como fazia um tempo que eu não escrevia nada por aqui, muito menos crítica de filme, resolvi retomar com um texto sobre o filme O Grande Mestre.

Para aqueles que não sabem, sou uma grande fã de filmes de artes marciais. Não sou especialista e nem posso dizer que vi a maioria deles, uma vez que a produtividade do cinema de ação de Hong Kong é pra deixar qualquer um doido. Se você der uma olhada na filmografia do Jackie Chan, por exemplo, vai notar que ele faz uns 3 a 4 filmes por ano! Isso é muita coisa! E olha que eu vi um bocado de filmes dele. Desde os mais novos aos mais antigos, como Drunken Master (que acredito que todo mundo viu) e Snake in the Eagle's Shadow (meu favorito). Mediante a uma produção dessas (que não é exclusividade de Chan, mas regra nesse tipo de cinema) é quase impossível assistir a tudo que foi e está em produção por lá. Mas mesmo assim, faço minha crítica como a boa criadora de caso que sou! XD

A história de O Grande Mestre (Yip Man, 2008, Hong Kong), conta de forma livre a história de um grande gênio das artes marciais chinesas, especialista e principal divulgador do estilo Wing Chun, Yip Man (mas também se usa Ip Man). O filme retrata uma fase de muita dificuldade na vida de Yip e sua família, quando eles ficam na miséria durante a invasão japonesa em 1937. Além de ver seus amigos cortando um dobrado para sobreviver e manter o fiapo de dignidade que ainda lhes resta, Mestre Yip ainda tem que colocar seu kung fu a prova contra os perversos invasores. Nada de spoiler, né? O filme é muito bom, não vou estragar nada!

Yip Man é interpretado por Donnie Yen, que defende o personagem com uma elegância incrível. No filme, Yip é um herói desses que aparecem raramente no cinema de hoje: honrado, cativante, extremamente forte e impossível de não te ganhar nas primeiras cenas. Ele é aquele mestre saído dos sonhos de quem tem alguma relação de amor com as artes marciais, que faz de tudo pra não lutar, que respeita o adversário, que enxerga além do mundano e que enfia o pau em qualquer um sem nem suar. A elegância dos movimentos, a expressão serena que o ator tem nas cenas de luta dão uma moral ao personagem que chega a arrepiar! Donnie Yen (que fez outros filmes que eu vi, como Herói, Blade II e Bater ou correr em Londres, mas que sabe Deus porque eu o apaguei da memória totalmente, não lembro dele em nenhum desses filmes!) mereceu todos os prêmios que recebeu por este papel.

As cenas de luta (que no fim das contas é o que todo mundo quer ver mesmo) são impressionantes. Para mim, elas precisam ser meio realistas, sabe. Eu prefiro. O cinema de artes marciais de Hong Kong tem muitas, digamos, variedades nesse aspecto. Filmes como aqueles mais antigos do Jet li como A saga de um herói, onde ele praticamente saía voando não fazem tanto a minha cabeça. Lembro que o pessoal no cinema chegou a rir das cenas em que Chow Yun Fat saía quase batendo asas em O Tigre e o Dragão. Quando usadas de forma meio over, fica tenso mesmo! Eu sou meio júri técnico da Dança dos Famosos nesse quesito: quero ver os movimentos perfeitos do estilo. Por isso que os antigos filmes de Jackie Chan, estão no meu coração, as cenas são realistas, os golpes são precisos e não tem muita firula. Depois ele se tornou bem mais malabarista, mas ainda sou muito fã! XD Alguns filmes americanos pós Matrix levaram as viagens marciais muito a sério, o que deixava tudo beirando o ridículo. Hoje, depois de filmes como Identidade Bourne, as lutas são mais realistas, mais pé no chão, como no ótimo Busca Implacável.


O pau come na casa de Yip Man!


As cenas de luta de Yip Man foram coreografadas pelo Sammo Hung. Lembra dele? Aquele gordinho de Arrebentando em Barcelona, o ciclista que apanhava em Mister Nice Guy e que estrelou uma série que passou na Band, Martial Law que se chamou aqui Um policial da pesada. Ele dirigiu e participou de alguns filmes do Jackie Chan e sua carreira é bem extensa com ator. Mas ele se superou em Yip Man! As cenas de luta são muito boas! Não sei se ele dirigiu as cenas ou apenas as coreografou, mas de qualquer maneira é incrível. Os ângulos, os golpes e o slow motion preciso e nem um pouco exagerado (alguns diretores andam errando a mão nesse recurso, vamos combinar!). Sammo se saiu muito bem e ainda me consegue um papel de destaque na continuação, Yip Man 2. Mas sobre esse, falamos outro dia.

A produção é muito caprichada. Foshan, terra natal de Yip (o filme usou locações em Xangai) é linda, colorida e charmosa num momento pré-invasão. Depois tudo fica cinza e triste, representando bem a situação de desesperança e terror que vivia a China. Isso não era muito comum nos filmes de artes marciais, muitas películas tinham uma produção pobre que beirava o deprimente, mas acredito que depois de produções como O Clã das Adagas Voadoras ficou impossível aceitar figurinos e cenários de quinta. Mas não espere esse glamour todo! O Grande Mestre é mais filme de luta mesmo, mas sem tranqueiras como os cavalos falsos dos filmes do Sai Yuk! XD

Algumas pessoas comentaram da campanha clara anti-japonesa no filme, já que os soldados nipônicos são retratados como verdadeiras pestes desalmadas. Vamos combinar que isso não está muito longe da verdade da época. Eles tocaram um terror na China e também na Korea, com episódios que deixariam os nazistas bem orgulhosos. A China de hoje é um país que, desculpe o palavreado, caga para os direitos humanos, enquanto o Japão é pacífico e defende um mundo sem armas nucleares. Depois que Hiroshima e Nagasaki foram bombardeadas o Japão mudou muito, mas ainda nega seu passado de vergonha e morte durante a segunda guerra e as invasões. No fim das contas, a verdade é que independente da nacionalidade, a humanidade sabe ser podre em qualquer língua.

Mas afinal de contas, por que fazer um filme sobre esse tal de Yip Man? Mesmo reconhecido pelas contribuições ao ensino do Wing Chun, Yip ganhou 3 filmes sobre sua história porque foi professor de Bruce Lee. Quando tinha 16 anos, Bruce iniciou seus estudos no Wing Chun e depois bem, simplesmente transformou o mundo. Algumas pessoas podem até nem gostar de Lee, mas a verdade é que sem ele não teríamos o cinema que temos hoje. Não o cinema de Hong Kong, mas o cinemão americano que tanto curtimos. Antes dele, não havia lutas coreografadas, um soco e o personagem já caía, levando com ele qualquer emoção pro buraco. É engraçado, mas o legado de Lee vai além dos filmes. Uma vez em um dos muitos documentários sobre sua vida, se me lembro bem, um de seus antigos alunos disse que depois dele, toda cidade tinha uma escola de artes marciais, seja qual for o estilo. Mas até aí ele significava muito para todos nós, mas para os chineses não tinha assim tanto valor. Mas após a gradual abertura da China para o mundo, os jovens tem buscado na figura de Bruce Lee um novo símbolo, um novo exemplo. Com o crescimento da popularidade de Bruce Lee, além de séries e outros produtos relacionados, fizeram um exelente filme para honrar o seu professor.



O verdadeiro Yip Man e Bruce Lee

Para aqueles que gostam de filmes de artes marciais ou apenas um filme bem legal com ação e algumas cenas bem tocantes, O Grande Mestre é uma exelente opção.

Trailer: http://www.youtube.com/watch?v=nhz4Jl6nf58